Nunca vivemos em uma era tão aberta para as relações sexuais, mas os jovens não ligam para isso

Em 2020, o Instituto Karolinska, na Suécia, se uniu a Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, e juntos entrevistaram 9.500  jovens da Geração Z – nascidos a partir de 1995 – descobrindo que 30,9% não haviam feito sexo nos doze meses anteriores a entrevista. Mas o que esse “apagão sexual” diz sobre as pessoas dessa geração?

A realidade do sexo é um paradoxo

É nisso que acredita o sexólogo e co-fundador da Dona Coelha, Renan de Paula. “Apesar de estarmos em uma era incrivelmente permissiva em relação ao sexo, com aplicativos de relacionamento e uma maior abertura para diferentes práticas sexuais, os jovens da Geração Z estão, surpreendentemente, tendo menos sexo do que as gerações anteriores”, diz.

As diversas razões são…

…de acordo com Renan:

  • Desenvolvimento Psicoemocional: “Hoje em dia, os jovens estão amadurecendo mais lentamente, tanto emocional quanto fisicamente. Isso pode ser resultado de um fenômeno chamado overparenting, onde os pais superprotegem seus filhos. Isso acaba gerando adolescentes que, apesar de desejarem mudar o mundo, muitas vezes carecem de maturidade para lidar com responsabilidades básicas da vida, inclusive relacionamentos afetivos”.
  • Mudanças nas Práticas Sexuais: Há um aumento no sexo oral e na masturbação, considerados alternativas “seguras” ao sexo penetrativo. “Posso dizer que seja uma desinformação, já que as ISTs ainda podem ser transmitidas via sexo oral. Essas outras formas de fazer sexo não são ruins, mas são um tabu, especialmente para as gerações mais velhas, e refletem uma mudança na maneira como o sexo é percebido e praticado”.
  • Consumo de pornografia facilitado: “Nunca o acesso à pornografia foi tão fácil. Desde pessoas completamente desconhecidas até a sua amiga que decidiu abrir um Onlyfans. O cérebro que antes funcionava para criar uma fantasia e explorar fetiches, é cada vez menos utilizado, sendo trocado por uma biblioteca audiovisual quase que infinita de tudo o que se pode desejar. Em alguns casos ainda, a prática excessiva de masturbação têm impacto significativo no desejo de se relacionar que pode acabar evitando interações reais”.
  • Viciados em dopamina: “A forma com que temos acesso aos hormônios do prazer é imensamente superior do que das gerações anteriores. É no jogo, rede social – que todos os principais aplicativos contém gatilhos que fazem com que você deseje ficar por mais tempo e se sinta recompensado com isso, como o like. Isso nos torna dependentes e faz com que muitos tenham dificuldades na rejeição ou situações que exigem inteligência emocional, como dentro de um relacionamento afetivo”.
  • Condições socioeconômicas e pandemia: “A instabilidade financeira e as incertezas trazidas pela pandemia da Covid-19 fizeram com que muitos jovens da geração Z priorizasse a estabilidade financeira e profissional em detrimento aos relacionamentos amorosos”.

Isso é um problema ou um desenvolvimento natural?

Para o sexólogo, é uma questão complexa, mas pode ser vista como uma resposta adaptativa às condições atuais ou como algo preocupante, dependendo de como você olha para a situação. De todo modo, Renan de Paula faz uma reflexão sobre a mudança nas dinâmicas de relacionamento, citando as ideias de Zygmunt Bauman sobre as relações líquidas.

Ele ressalta que, embora as transformações sejam marcantes, não há razão para pessimismo, já que com o amadurecimento das tecnologias e da própria geração, novas formas de relacionamento e intimidade continuarão a surgir, e, embora diferentes, não serão necessariamente erradas.

Futuras gerações e o sexo

A Geração Alpha são as crianças nascidas a partir de 2010 e elas podem muito bem seguir um caminho semelhante, influenciadas por tendências socioeconômicas e tecnológicas contínuas. “Mas é importante lembrar que cada geração tem suas peculiaridades, moldadas pelo contexto em que crescem. Assim como existem movimentos de contracultura. Vale ficar atento para entender essas mudanças e apoiar os jovens em suas jornadas de autoconhecimento e bem-estar sexual”, finaliza o sexólogo.