A nova geração de jovens tem sonhado com a fama na internet, mas podem estar sendo enganados por esse mundo utópico

“Mudam os meios, mas a motivação não é muito diferente.” É assim que Andréa Krug, psicóloga com mais de 30 anos de experiência em RHs, inicia a conversa sobre por que os adolescentes têm sonhado, cada vez mais, em seguir uma carreira na internet ao invés de uma profissão ‘tradicional’. A verdade é que o deslumbre com o glamour da fama não é de hoje, mas sem dúvidas a internet intensificou ainda mais essa fantasia, que pode ser traiçoeira.

A utopia do dinheiro fácil

Não é difícil entender o motivo pelo qual os olhos dos mais jovens brilham tanto para profissões como a de influenciador digital. “Um mundo glamoroso, onde parece haver apenas facilidades e pouco esforço. Um mundo de muito dinheiro, muita visibilidade e reconhecimento, o que mexe diretamente na autoestima das pessoas”, define Andréa.

O que, de acordo com a psicóloga, não é muito diferente do que levava as pessoas a sonharem em ser jogador de futebol, modelo, ator ou atriz há tempos atrás. “O que muda é que a possibilidade parece muito maior, tem mais influencers e não são só os talentosos. Você pode fazer sucesso por fazer caretas horríveis, pela falta de habilidade de contar piadas, ou seja, está mais próximo dos chamados cidadãos comuns.”

Um meio cada vez mais procurado

A profissional ainda aponta que o grande atrativo do – e diferencial – do glamour digital é a percepção de encontrar, com facilidade, fama e fortuna, o que significa, na mente de milhões de pessoas hoje, reconhecimento e favorecimentos. “Só que uma sociedade mais fluida e conectada, como a que estamos vivendo, pode tornar a busca pela popularidade mais difícil. É matemático, tem mais gente tentando”, reflete.

É óbvio: é mais fácil e mais rápido do que estudar por anos, passar por um teste e conseguir uma vaga.
“A velocidade também é um fator que conta bastante. Estamos todos mais impacientes, desejamos consumir conteúdos mais rápidos”, completa Andréa.

Ilusão x realidade do glamour digital

Pode parecer inofensivo, mas essa ambição dos adolescentes por um lugar nos holofotes pode se tornar um problema real e ser nocivo à questões ligadas à realização pessoal, autoestima e conexão com a realidade. “Há uma busca por aceitação social e validação. Mas também há uma espécie de ilusão coletiva de que a vida é ‘cor-de-rosa’ para essas pessoas (os influenciadores), que elas não têm dificuldades ou problemas, que não sofrem, e que tudo vem de ‘mão beijada’, sem muito esforço”, pondera a psicóloga. Portanto, sim, essa ganância é extremamente preocupante para os jovens quando há excesso. “Principalmente do tempo que é perdido nas redes sociais, o que já apresenta uma dezena de estudos que comprovam que isso pode ser considerado vício”, reforça Andréa.

Sem maldade

Apesar de tudo isso, não é certo apontar o dedo de forma negativa e colocar todos na mesma caixinha do erro. “É importante ressaltar que, muitas vezes, a intenção do jovem é a melhor possível: oferecer uma condição de vida melhor à sua família. Por isso, deve ser separado a intenção da ação. Não é a intenção que está equivocada, e sim a forma como ele [o jovem] busca isso”, enfatiza a especialista.

Outro ponto importante, segundo ela, é sempre lembrar que limites e frustrações são ótimos – e essenciais – para os jovens em formação. “Quanto antes esse aprendizado vem para o jogo, mais eles amadurecem”, acrescenta.

O glamour digital é um campo perigoso

E nada disso é papo de conservadorismo, hein? É claro que os tempos mudam e, com isso, mudam-se os meios de trabalho, de entretenimento, mudam-se os sonhos e desejos das pessoas. Mas algumas coisas são fisiológicas e podem, sim, ter consequências ruins. “Os mais jovens, por terem ainda seu córtex pré-frontal em formação, têm pouca noção de perigo. O lugar no topo passa a ser a qualquer cus-
to, e podem se meter em encrencas, cair nas mãos de golpistas ou mesmo abusadores que ‘ven-
dem’ ilusões. Infelizmente, o noticiário está povoado desse tipo de notícia “, conclui Andréa.