A vida da internet não é real! Foto: Pixabay

O interesse pela vida alheia nas redes sociais é tentador, mas essa obsessão é ilusória e pode acarretar sérios problemas de autoestima

Hoje em dia, com a internet, temos tudo que queremos na palma da mão. Com apenas um clique, ou um “arrasta para cima”, temos acesso a produtos, informações, notícias e, talvez, o ponto mais tentador: a rotina das outras pessoas. É claro que, por um lado, as redes sociais nos aproximam uns dos outros. E estar por dentro do que familiares ou pessoas queridas estão fazendo é até divertido – ou só satisfatório mesmo. 

Mas e quando essa curiosidade pela vida alheia começa a ditar a forma como enxergamos o mundo e a nós mesmos? Afinal, a internet se tornou um ambiente propício para vender padrões irreais, sejam físicos, financeiros, e de comportamento – e isso é muito perigoso. 

Todo mundo tem espaço na internet

A grande maioria das pessoas com quem convivemos está on-line nas redes sociais, seja por trabalho ou para uso pessoal, como forma de entretenimento. Tatiane Paula, psicóloga especialista em relacionamentos, compulsões, ansiedade e transtornos mentais, explica que a exposição digital pode ter consequências diretas para saúde mental. Pelo simples fato de que, na internet, muitas pessoas se sentem livres para opinar sobre o que quiserem. “Elas se vêem no direito de comentar, xingar e falar sobre qualquer aspecto da vida, ou corpo, de outra pessoa sem se preocupar com o que isso pode causar na saúde mental de quem está lendo.” 

Ainda, segundo a profissional, quem escreve essas mensagens acredita estar sendo sincero e correto por falar o que pensa. Apesar de isso representar certa covardia, já que se escondem atrás dos perfis, muitas vezes falsos, criados apenas para importunar e atacar outra pessoa. “Eles se aproveitam da facilidade que as redes sociais trazem, que é a distância. Afinal, será que essas pessoas teriam coragem o suficiente de falar na cara de alguém tudo o que digitam nas redes sociais?”, questiona.

Quem impõe esses padrões na internet? 

Como toda mídia da época, nos dias de hoje são as plataformas on-line que definem e propagam os padrões de beleza, e de vida, que devem ser seguidos por todo mundo. É fato que esses padrões sempre existiram. A diferença, segundo a psicóloga, é que “antes, para se ter acesso a eles, era necessário comprar uma revista ou assistir a televisão, e agora tudo está na palma das mãos, através do celular”. 

Também em termos de comparação, podemos observar a mudança de quem serve como modelo para esses padrões de beleza, que antes eram estabelecidos por modelos ou atrizes que apareciam em grandes meios de comunicação. “Atualmente, são os influenciadores que fazem esse papel, e eles nem precisam ser conhecidos nacionalmente. A vida e corpo perfeito que muitos influenciadores alcançam se tornam um desejo para quem segue e consome aquele conteúdo”, pontua a especialista. 

“Quem consome esse conteúdo sempre vai se comparar e achar que o que tem em sua vida não é bom o bastante, que não está se esforçando o suficiente. Isso afeta a autoestima, pois a pessoa coloca a vida do influenciador como meta a ser alcançada.”

Tatiana aponta, ainda, que isso não acontece só por quem segue esses influenciadores. “Essa comparação e impacto na autoestima também acontece quando conhecidos postam suas realizações nas redes sociais. Pois algumas pessoas se sentem mal por não estar no mesmo patamar.”

“Quem assiste, desconsidera o que está off-line, e acredita que o que é postado é a verdade absoluta sobre a realidade do outro. Usam essa régua como uma medida entre sucesso e fracasso.”

Eu preciso ser aceito! (Será?)

De acordo com a psicóloga clínica, Fernanda C. Alexandre, grande parte dessa obsessão por modelos irreais de vida e corpo vêm da cobrança para sermos aceitos socialmente – seja essa uma cobrança interna, ou do mundo. Essa busca por “estar adequado ao ideal” gera uma onda de comparações que deixa as pessoas cada vez mais confusas. “A aceitação social é uma necessidade humana fundamental, e os julgamentos abertos podem desencadear ansiedade, impactando a autoestima. A distorção da realidade nas redes sociais é uma área de preocupação psicológica.”

A profissional afirma que o suporte psicológico é essencial quando essa dinâmica potencializa a falsa ideia de pertencimento. “Abordar a comparação social é fundamental para mitigar sentimentos de inadequação. A terapia cognitivo-comportamental pode ser aplicada para explorar distorções cognitivas, desafiando pensamentos automáticos negativos e promovendo uma visão mais equilibrada da vida”, indica Fernanda.

Para quem vive disso: terapia!  

Ficar fora das redes sociais não é uma opção viável para todo mundo. Até porque, hoje em dia, muita gente tem os trabalhos na internet como principal fonte de renda. Então, como gerenciar toda essa situação para não adoecer no meio digital? Fernanda afirma que o acompanhamento profissional é o melhor caminho. “Lidar com o estresse on-line, especialmente para aqueles que não têm escolha a não ser trabalhar nesse ambiente, requer uma abordagem psicoterapêutica mais estruturada em terapia cognitivo-comportamental. Isso pode incluir o desenvolvimento de habilidades de regulação emocional, estabelecimento de limites claros entre vida profissional e pessoal, e a criação de um suporte emocional sólido.”

Nem tudo é ruim

Para deixar essa discussão mais leve, precisamos também lembrar que, apesar de todos esses pontos negativos, as redes sociais também podem ajudar, já que é um espaço aberto para profissionais da área compartilharem informações. Tatiane Paula admite que, por causa da internet, a pauta “saúde mental” está muito mais em alta, já que tanto o conteúdo quanto os profissionais estão mais acessíveis. “Antes, para ter acesso a psicólogos e psiquiatras, era preciso marcar uma consulta presencial, tinha custos com deslocamento, trânsito e um número reduzido de profissionais. Porém, com a pandemia, os atendimentos on-line se tornaram cada vez mais comuns e começaram a fazer parte da vida das pessoas, possibilitando que do conforto da sua casa a pessoa possa cuidar da saúde mental”, conclui a psicóloga.