Sertralina para emagrecer? 4 em cada 10 pessoas sofre complicações

Você sabia que 4 em cada 10 pessoas têm reações adversas ao usar sertralina como ‘truque’ para emagrecer?

Pesquisa da JAMA Psychiatry revela que até 43% dos usuários de antidepressivos relatam efeitos adversos significativos. O uso off-label da sertralina para emagrecimento, popularizado nas redes, preocupa farmacêuticos e psiquiatras por seus riscos à saúde física e mental

O uso de medicamentos psiquiátricos sem prescrição tem ganhado força nas redes sociais, mas especialistas alertam: essa tendência pode ser extremamente perigosa. Muitas pessoas utilizam indevidamente a sertralina, um antidepressivo da classe dos inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), como um suposto “truque” para emagrecer. Segundo um levantamento publicado pela JAMA Psychiatry, até 43% dos usuários de antidepressivos relatam efeitos colaterais significativos, e esse índice tende a ser ainda maior em pessoas que usam o medicamento sem indicação clínica.

Uso arriscado

Para o Prof. Luiz Moreira, farmacêutico bioquímico, mestre em Ciências da Saúde e especialista em Saúde Personalizada e Desenvolvimento de Manipulados e Suplementos, essa prática é não apenas equivocada, como perigosa. “Não há respaldo científico ou recomendação médica para o uso da sertralina como emagrecedor. Trata-se de um medicamento com ação direta sobre o sistema nervoso central. Indicado para casos como depressão, transtorno obsessivo-compulsivo, ansiedade generalizada e síndrome do pânico”, afirma.

Do ponto de vista da saúde pública, essa banalização é extremamente preocupante. “Vejo com grande preocupação este uso off-label da sertralina com fins estéticos ou de emagrecimento. O farmacêutico, como profissional da linha de frente no contato com a população, tem o dever de orientar e alertar sobre os riscos do uso indevido de medicamentos controlados”, afirma o Prof. Luiz Moreira. “Quando redes sociais promovem o uso de psicotrópicos como ‘solução fácil’ para emagrecimento, produtividade ou bem-estar, elas distorcem a finalidade terapêutica desses medicamentos e colocam vidas em risco. É essencial combater a medicalização da vida cotidiana por meio da educação em saúde, da responsabilidade técnica e da regulamentação ética do conteúdo digital.

A Sertralina necessita de indicação

Estudos conduzidos por universidades como Harvard e Stanford mostram que o uso off-label de ISRSs, como a sertralina, representa cerca de 20% de todas as prescrições de antidepressivos nos EUA. Resultados fora das indicações aprovadas frequentemente falham em comprovar eficácia e aumentam os riscos de reações adversas, como disfunções hormonais, problemas gastrointestinais e sintomas neurológicos.

Do ponto de vista farmacológico, a sertralina age aumentando a disponibilidade de serotonina nas sinapses cerebrais. Esse neurotransmissor, relacionado ao bem-estar, também participa da regulação do apetite — o que pode provocar variações iniciais no comportamento alimentar. No entanto, o uso sem orientação médica carrega uma série de riscos metabólicos e fisiológicos.

“O uso indiscriminado pode alterar o sono, os níveis de glicose e o metabolismo dos lipídios, além de provocar tremores, sudorese excessiva, disfunções sexuais e problemas gastrointestinais”, pontua o farmacêutico. Um dos quadros mais preocupantes é a síndrome serotoninérgica, uma condição rara, mas potencialmente fatal, causada pelo excesso de serotonina no sistema nervoso central. Segundo dados da FDA Adverse Event Reporting System, casos de síndrome serotoninérgica vêm aumentando, especialmente entre jovens adultos que misturam antidepressivos com outras substâncias.

A interrupção deve ser feita com cuidado

Outro risco frequentemente ignorado é a descontinuação abrupta do medicamento. Apesar de a sertralina não causar dependência no sentido clássico, sua interrupção sem orientação pode levar à chamada síndrome de descontinuação. Caracterizada por tontura, irritabilidade, zumbido e até sensações semelhantes a “choques elétricos” na cabeça.

Luiz Moreira alerta que a promoção de psicotrópicos nas redes sociais banaliza perigosamente seu uso. “Quando um medicamento como a sertralina passa a ser vendido como solução rápida para emagrecimento, produtividade ou bem-estar, há um desvio completo de sua finalidade terapêutica. É preciso reforçar a educação em saúde e combater a medicalização da vida com responsabilidade técnica e ética.”

Uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelou que o uso inadequado de medicamentos controlados aumentou em 45% entre jovens de 18 a 30 anos nos últimos cinco anos. Impulsionado especialmente por tendências virais e a busca por soluções rápidas. O alerta é direto: profissionais devem prescrever e acompanhar o uso de medicamentos que atuam sobre o cérebro. O “truque” que promete resultados rápidos pode custar caro à saúde — física e mental


Ana Carvalho

Repórter de revista e portal na Editora Alto Astral. Bacharela em jornalismo e pós-graduada em Comunicação e Mídia pela Universidade...