Entenda o Transtorno Dissociativo de Identidade e quais fatores podem motivar a condição
Imagine ter dentro de você mais de 30 personalidades diferentes, cada uma com suas próprias características, memórias e comportamentos únicos, capazes de interagir entre si. Essa é a realidade de pessoas que sofrem de Transtorno Dissociativo de Identidade (TDI), uma condição psicológica complexa que desafia nossa compreensão da mente humana.
No Brasil, existem poucos estudos sobre o transtorno e sua prevalência no país é pouco conhecida. Já nos Estados Unidos, estima-se que cerca de 1,5% da população conviva com esse distúrbio. Uma característica importante do TDI é que as pessoas que o têm, geralmente, não conseguem reconhecer sua própria condição, devido à amnésia dissociativa. O que significa que elas sofrem “apagões” de memória quando outra identidade assume o controle.
O que é TDI?
O Transtorno Dissociativo de Identidade, frequentemente chamado de TDI, é uma condição em que uma pessoa apresenta duas ou mais identidades distintas. Também conhecidas como “personalidades” ou “alter egos”. Uma amnésia significativa, que ocorre enquanto outras personalidades estão no controle, desencadeia a transição entre elas. “O TDI surge, em geral, após uma experiência traumática que faz com que o cérebro se ‘fragmente’ em várias personalidades como uma forma de se proteger melhor da situação. Ele pode se manifestar como duas ou dezenas de personalidades com características, gostos, pensamentos e memórias diferentes que podem interagir entre si de uma forma altamente complexa”, explica Fabiano de Abreu Agrela, pós-PhD em neurociências e membro da Society for Neuroscience nos EUA e da Sigma X.
Sua origem
O TDI, então, está intrinsecamente ligado a experiências traumáticas, como abuso físico, sexual ou emocional, especialmente durante a infância. “O TDI tem muitas variações entre cada caso. Em alguns as personalidades são totalmente independentes, em outros elas interagem em uma espécie de universo próprio”, reforça Agrela. Embora fatores genéticos e predisposições familiares possam contribuir, o trauma é o principal fator. “Perdas impactantes ou eventos de alto estresse, especialmente durante a infância, são grandes desencadeadores para o transtorno, fazendo com que o cérebro acione uma ferramenta de defesa que cria as personalidades como uma barreira de impacto para o trauma.”
Casos reais de TDI
Recentemente, o Fantástico exibiu uma reportagem especial que mostrou casos de pessoas que têm e convivem com o TDI. Uma delas é Giovanna Blasi, de 21 anos, que afirma contar com 18 identidades, cada qual com sua personalidade, trejeitos, gostos, modo de falar, etc. Apesar de preferir não expor detalhes, Giovanna conta que viveu eventos traumáticos durante a infância. Esse teria sido o ponto de partida para o aparecimento de sua primeira identidade, ‘’Momô’’, uma criança de 5 anos. Além dessa e da própria Giovanna, surgiram outras: Aline, Aurora, Dandara, Aiana, Tatá, Herbert, Isabella, Laura, Lina, Lua, Luara, Luiza, Maria Helena, Melanie, Jim e Ariel.
A jovem descobriu o TDI em 2022. Ela contou à reportagem que foi afastada da faculdade e do trabalho por estar disfuncional, e que entrava em crises dissociativas, trocando de personalidade pelo menos 14 vezes por dia. A mãe então procurou atendimento psiquiátrico e psicológico, e o diagnóstico veio poucos meses depois de iniciarem a investigação.
Outro caso exibido no programa da TV Globo foi o de Patrícia Fagundes da Silva, de 28 anos. A manicure relata ter 28 identidades e, inclusive, disse que prefere ser chamada de Sistema República – que reúne todos os perfis. É comum que esses pacientes se autodenominem “sistemas” e se comuniquem através de um alter, que atua como o porta-voz para fornecer informações. Cada alter é encarregado de assumir o controle (a “frente”), possui sua própria história e personalidade, que são distintas daquelas do “anfitrião” principal. Além das diferenças de nomes, eles podem variar em termos de idade, gênero, orientação sexual, etnia, preferências pessoais e crenças religiosas.
TDI tem tratamento!
O Transtorno Dissociativo de Identidade pode frequentemente coexistir com quadros de depressão e ansiedade. Devido à combinação desses fatores, os pacientes podem enfrentar situações graves, incluindo tentativas de suicídio. Por isso, o acompanhamento de um profissional é extremamente necessário para garantir o bem-estar de quem sofre com essa condição.
A boa notícia é que o TDI é tratável. O tratamento envolve principalmente terapia cognitivo-comportamental, que visa identificar e desafiar os padrões de pensamento disfuncionais. Essa abordagem tem como objetivo unificar as diferentes personalidades, promovendo a cooperação e a harmonia interna”, explica Agrela.
É importante ressaltar que cada caso de TDI é único, e os profissionais de saúde adotam abordagens totalmente individualizadas para atender às necessidades específicas de cada paciente. O processo é longo e desafiador, mas com resultados de longo prazo que podem melhorar significativamente a qualidade de vida dos pacientes. “É preciso entender que esse é um transtorno, uma doença, e como tal é fundamental que o tratamento e os conselhos do profissional responsável pelo caso sejam ouvidos e seguidos, cada caso é um caso”, orienta o neurocientista.
Apoio da família e amigos é essencial
A convivência com alguém que tem TDI pode ser desafiadora, especialmente devido às mudanças frequentes entre as personalidades. Compreensão, paciência e apoio emocional são essenciais para ajudar o paciente a enfrentar essa condição complexa. “O apoio da família e amigos durante o processo é essencial para o facilitar o tratamento e melhorar seus resultados”, afirma o especialista.
O Transtorno Dissociativo de Identidade desafia nossa compreensão da mente humana, mas também nos lembra da resiliência e da importância do apoio e compreensão em momentos difíceis. Com tratamento adequado e apoio emocional, aqueles que sofrem com o TDI podem encontrar a esperança e a cura em sua jornada de recuperação. “O TDI pode ser controlado, seja através da harmonia entre as personalidades ou da unificação delas para reduzir o seu número, a depender de cada caso, a abordagem é totalmente individualizada e com resultados de longo prazo”, finaliza o especialista.