O trabalho está matando as pessoas, sim! Foto: Pixabay

Isso não é uma simples metáfora. O atual cenário mundial colabora com a desumanização dos trabalhadores, que adoecem e perdem suas vidas

O escritor e pesquisador Jeffrey Pfeffer defende firmemente sua afirmação de que o trabalho está, literalmente, matando pessoas. E que essa realidade não é uma simples metáfora. Como professor na Escola de Pós-Graduação em Negócios da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, ele baseia sua argumentação em décadas de pesquisa realizada não apenas em seu país, mas também em outras partes do mundo.

É uma realidade de trabalho incontestável hoje

Ao longo de sua carreira, Pfeffer escreveu, ou coescreveu, 15 livros sobre teoria organizacional e recursos humanos. Em sua obra mais recente, Morrendo por um salário, ele expõe como o sistema de trabalho contemporâneo contribui para a doença e até mesmo para a morte das pessoas.

Assi, um dos casos que Pfeffer destaca em seu livro é o de Kenji Hamada. Um homem de 42 anos que faleceu de um ataque cardíaco enquanto estava no escritório em Tóquio. Hamada trabalhava incríveis 75 horas por semana e gastava cerca de duas horas todos os dias para ir e voltar do trabalho. Pouco antes de sua morte, ele havia trabalhado por 40 dias consecutivos sem folga, deixando sua esposa preocupada com seu estado extremamente estressado.

Essa não é uma história isolada de morte causada por trabalho

Pfeffer reúne vários exemplos semelhantes em seu livro, que destaca os efeitos prejudiciais de um sistema de trabalho excessivamente exigente. Ele aponta que 61% dos trabalhadores nos Estados Unidos afirmam que o estresse causou problemas de saúde para eles. Enquanto 7% relataram ter sido hospitalizados por questões também relacionadas ao trabalho. “O acúmulo do nível de estresse, potencializado pela ausência de relaxamento e interações sociais, pode levar a sérios problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão”, afirma a psicóloga Larissa Fonseca, especialista clínica em Ansiedade, Crise de Pânico, Burnout e Sono. 

As consequências chegam para a empresa também

Partindo da perspectiva econômica, Pfeffer estima que o estresse no local de trabalho esteja ligado à morte de aproximadamente 120 mil trabalhadores americanos. Ele também calcula que as empresas americanas gastam cerca de US$ 300 bilhões anualmente para lidar com problemas de saúde de seus funcionários.

O lucro é o mais importante de tudo? 

Em conclusão, é o que parece. Em uma entrevista concedida a BBC News Mundo, Pfeffer expôs sua teoria de como o trabalho moderno afeta os trabalhadores. Para ele, os efeitos prejudiciais das longas jornadas, demissões e falta de cobertura de saúde, são os gatilhos que geram insegurança econômica, conflitos familiares e doenças. Isso também foi citado pela psicóloga. 

Sobre esse panorama, Pfeffer critica firmemente o atual estado de desumanização do trabalho. Onde as empresas priorizam os interesses dos acionistas – ou seja, quem é responsável pelo dinheiro – ao invés dos funcionários. Ele aponta que os empregadores são os principais responsáveis por essa situação. Mas não os únicos, pois ele vê que os governos fecham os olhos para o problema.

Há luz no fim do túnel?

Sim, mas é preciso que haja colaboração de todas as partes. Para Pfeffer, é essencial uma intervenção política para resolver esse problema, que é sistêmico. Ele argumenta que os custos econômicos e sociais associados à saúde precária dos trabalhadores fazem com que seja praticamente obrigatório uma mobilização e esforço coletivo para mudar essas condições.

Embora reconheça que os trabalhadores enfrentam desafios ao tentar melhorar suas condições de trabalho individualmente, Pfeffer enfatiza a importância de assumir a responsabilidade pela própria saúde. Para ele, a solução mais viável agora é pressionar os governos para implementarem leis que protejam os trabalhadores e promovam um ambiente de trabalho mais saudável e equilibrado para todos. “Colegas e supervisores compreensivos podem oferecer apoio emocional, colaboração e flexibilidade, permitindo que os indivíduos enfrentem desafios de maneira mais eficaz. Diversos programas em saúde de grandes corporações promovem a autopercepção, integração do time e uma liderança preparada para lidar com humanos e suas emoções”, indica Larissa.