A força da escrita na vivência da maternidade real Falar das contradições e das vulnerabilidades da maternidade real é uma forma de romper com o mito da gestação idealizada

Livro de Andrea Nunes une narrativas íntimas da gestação com reflexões atuais, compondo um retrato sincero, divertido e comovente da maternidade

Quem disse que toda grávida precisa estar radiante? Às vezes a gestação vem com crises de choro por culpa depois de dois pedaços de pizza, discussões acaloradas por causa de um ultrassom, palpites invasivos sobre o tamanho da barriga e a vontade sincera de sumir no meio do chá de bebê. Essa vivência real e comum se choca com a expectativa social de uma maternidade leve, grata, plena, sempre com um brilho no olhar.

Falar das contradições, das vulnerabilidades e dos sentimentos menos “instagramáveis” da gestação é uma forma de romper com o mito da maternidade idealizada e abrir espaço para outras experiências. Cada vez mais mulheres têm encontrado na escrita um jeito de fazer isso, como aconteceu com autora Andrea Nunes.

Da gestação ao papel: nasce a maternidade real

Durante a gravidez do primeiro filho, ela registrou tudo que sentia. Com franqueza desconcertante e humor delicado, escreveu sobre medo, raiva, enjoo, cansaço, vergonha, amor em excesso e uma sensação de inadequação que, à época, parecia inconfessável. Esses textos foram publicados em um blog pessoal, lidos por amigas e desconhecidas que se reconheceram naquelas palavras, e, anos depois, se transformaram em livro.

O livro que abraça as verdades da maternidade real

“Engravidei”, publicado pela Editora Caravana, reúne crônicas escritas em 2014, revisitadas e comentadas pela autora dez anos depois. Ao lado de cada texto original, Andrea acrescenta notas atuais, criando um diálogo entre a mulher que viveu a gestação e a mãe que se tornou. A leitura mistura humor, ironia e escuta, e propõe um olhar mais generoso para as tantas contradições do puerpério e da identidade materna.

“Revisitei uma parte de mim que ainda precisava ser abraçada. Decidi que não ia apagar nada. Ia olhar com carinho e dizer: eu entendo você”, afirma Andrea. Ao longo do livro, ela compartilha desde a escolha do nome do bebê à pressão para descobrir o sexo da criança, passando pelos conselhos atravessados de estranhos e pela busca exaustiva por uma sensação de normalidade. “Não fiz um livro sobre maternidade perfeita. Fiz sobre a maternidade possível, aquela que a gente sente no corpo, nos sonhos e nos sustos.”

Escrever é também cuidar

O projeto foi desenvolvido com a mentoria da jornalista e escritora Ana Holanda, que também assina o prefácio da obra. Andrea participa da comunidade de escrita afetiva coordenada por Ana, onde amadureceu o projeto e descobriu que contar a própria história podia ser também um gesto de cuidado com outras mulheres. “A Ana me ajudou a entender que a maternidade é escrita. É corpo e palavra. E que minha história, contada do meu jeito, também é legítima.” O livro ainda conta com paratexto de Vanessa Passos, escritora premiada, autora do romance A Filha Primitiva.