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O congelamento de óvulos vem registrando um crescimento expressivo no Brasil nos últimos anos, acompanhando avanços tecnológicos e transformações sociais profundas no modo como as mulheres planejam a maternidade
De acordo com dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o número de ciclos de criopreservação praticamente dobrou entre 2020 e 2023, representando um aumento de cerca de 98% no país. Nesse mesmo período, o volume de óvulos congelados passou de aproximadamente 56 mil para mais de 111 mil unidades. O maior crescimento foi observado entre mulheres com menos de 35 anos, faixa etária em que a técnica apresenta melhores taxas de sucesso.
A tendência acompanha um fenômeno global: muitas mulheres estão adiando a maternidade por motivos profissionais, pessoais ou por ainda não terem encontrado o parceiro ou parceira com quem desejam formar uma família. Nesse cenário, o congelamento de óvulos deixa de ser uma alternativa restrita a quem enfrenta problemas de fertilidade e passa a integrar estratégias de planejamento reprodutivo mais amplas e conscientes.
Mudança de mentalidade
Para a ginecologista e obstetra Dra. Taciana Fontes Rolindo, especialista em Reprodução Assistida e reconhecida por sua competência técnica, ética e olhar sensível, esse movimento representa uma mudança significativa de mentalidade. “Temos observado um movimento muito claro de preservação da fertilidade, por mulheres que optam por adiar a maternidade, seja por carreira, seja por não terem ainda o parceiro ou parceira com quem desejam formar família. A técnica, portanto, deixa de ser pensada apenas em casos de infertilidade e passa a ser parte de um planejamento reprodutivo”, explica.
A especialista alerta, no entanto, que a idade ainda é um fator determinante para os resultados. Segundo ela, quanto mais jovem a mulher no momento da criopreservação, maiores são as chances de sucesso no futuro. A fertilidade feminina cai consideravelmente a partir dos 35 anos e, após os 40, as chances de concepção natural tornam-se bem menores. Além disso, embora o congelamento de óvulos represente uma possibilidade concreta de ampliar as oportunidades de gravidez, ele não é uma garantia absoluta. “Tratar fertilidade é também tratar de biologia, tempo e expectativas. O congelamento pode ampliar possibilidades, mas não é bilhete garantido de sucesso”, ressalta Dra. Taciana.
Pesar prós e contras
Outro ponto destacado pela médica é a importância de encarar a decisão de congelar óvulos de forma informada e responsável. O processo envolve expectativas, custos, manutenção dos óvulos congelados e decisões futuras que podem ter implicações emocionais e práticas. “É importante que a mulher, e o casal, se for o caso, entenda os prós e os contras, os custos financeiros, os riscos (ainda que baixos) e as implicações no futuro”, afirma.
O procedimento, que se tornou mais acessível e seguro com os avanços da vitrificação, consiste basicamente em cinco etapas: avaliação da reserva ovariana, estimulação controlada dos ovários, punção para coleta dos óvulos, congelamento ultrarrápido e, quando desejado, descongelamento e fertilização in vitro, com posterior transferência do embrião. As taxas de sucesso após o descongelamento chegam a 95% em clínicas com boa infraestrutura e equipe especializada.
O mercado de medicina reprodutiva acompanha esse crescimento: em 2023, o setor movimentou cerca de R$ 1,3 bilhão no Brasil, com expectativa de ultrapassar R$ 3 bilhões até 2026. Os números indicam que o congelamento de óvulos não é mais um recurso restrito a casos médicos específicos, mas parte de uma nova forma de lidar com tempo, maternidade e autonomia reprodutiva.
Para a Dra. Taciana Fontes Rolindo, a técnica representa, antes de tudo, liberdade de escolha. “Cada caso é único. A decisão deve levar em conta idade, saúde, expectativas e suporte emocional. O congelamento de óvulos não é uma imposição. É uma possibilidade para que a mulher possa decidir sobre seu futuro reprodutivo de forma mais tranquila e consciente”, conclui.