
Para psicanalista, a cultura do patriarcado reprime nos homens a manifestação de emoções: isso levaria as mulheres a dominarem a literatura parental
O Dia dos Pais, que será comemorado no próximo domingo (10), é um bom motivo para refletir sobre a literatura parental. Enquanto as mulheres dominam a escrita sobre maternidade e criação de filhos, o olhar masculino sobre esses temas ainda é escasso. Mas, afinal, por que é tão importante ter acesso a narrativas de pais, e não apenas de mães?
Cultura do patriarcado
Para a psicóloga, psicanalista, escritora e especialista em psicanálise Maria Bruna Mota, a ausência de vozes masculinas na literatura parental é um reflexo do patriarcado. “A cultura do patriarcado impõe lugares definidos para homens e mulheres. Ao homem, cabe o papel de provedor, de forte, o que corresponde a um homem que não demonstra sentimentos”, explica. Isso faz com que muitos pais reprimam suas emoções e, consequentemente, expressem-se menos.
Ela reforça que a falta de diálogo sobre a paternidade pode levar a um desequilíbrio na dinâmica familiar. “Quando essa dinâmica falha, possivelmente haverá sobrecarga para a mãe, que acabará por ficar mais nesse papel de mãe e se afastar do lugar de mulher”, alerta a psicóloga e psicanalista. A solidão paterna, muitas vezes, é um sintoma dessa pressão, manifestando-se no retorno precoce ao trabalho e na falta de tempo para cuidar do bebê. É aí que a conversa franca sobre as dificuldades da paternidade se torna vital, tanto para o bem-estar do casal quanto da família.
Perspectiva dos homens
Na opinião do médico Antonio Carlos Turner, especialista em pediatria, a diversidade de visões é fundamental para a saúde e o desenvolvimento das crianças. “O desenvolvimento infantil, em sua complexidade e múltiplas facetas, só tem a ganhar com a inclusão ativa de vozes masculinas”, afirma.
O especialista também alerta para o desafio da desinformação, que afeta diretamente o atendimento pediátrico. Pais sobrecarregados e com pouco tempo para se aprofundar em leituras acabam buscando dicas rápidas na internet, muitas vezes recorrendo a fake news. Uma literatura mais inclusiva, com a perspectiva masculina, poderia engajar mais os pais na busca por informações confiáveis, segundo o médico.
Ele vai além, defendendo a necessidade de uma educação parental estruturada, que domine todos os ambientes frequentados pela criança. Para Turner, as figuras paternas e maternas preparadas para os desafios, como a amamentação ou o calendário de vacinação, “proporcionarão mais segurança à criança e ao futuro adulto”, ressalta.
Livro dá voz a pai
Um livro que pode suprir essa lacuna é “Enquanto ele não dorme”, de Diego Domingues (Editora Labrador). Na obra, o autor narra os desafios e a desorientação dos primeiros meses de paternidade. Longe da idealização, ele fala da privação de sono, das aflições e, até mesmo, da dificuldade de sentir o “amor instantâneo” pelo bebê, um sentimento que a sociedade espera e, até mesmo, cobra. “Não é fácil amar de imediato. E nem precisou ser”, diz o autor. Essa honestidade, por si só, pode servir como um convite para que as mulheres identifiquem a complexidade da jornada do parceiro.
Edição: Fernanda Villas Bôas