Enxaqueca: 70% dos pacientes sofrem com aumento da frequência urinária

Aumento da frequência urinária também pode ser um preditivo de crises de dor de cabeça

A enxaqueca envolve, definitivamente, muito mais do que dores de cabeça frequentes. Tontura, vertigem, sensibilidade à luz, sons e cheiros, irritabilidade e falta de concentração são os mais falados. Mas um sintoma que também pode aparecer – e não é tão raro – é o aumento da frequência urinária.

“Esse sintoma pode surgir durante todas as fases de crise, mas em pacientes com a doença crônica pode apresentar essa característica de forma constante. Mesmo sem dor de cabeça intensa, o sistema nervoso autônomo pode estar envolvido e gerar sintomas urinários, geralmente de polaciúria, caracterizado por aumento do número de micções com diminuição do volume da urina, ou seja, urinar pouca quantidade muitas vezes ao dia”, explica o Tiago de Paula, médico neurologista especialista em Cefaleia pela Escola Paulista de Medicina (EPM/UNIFESP), membro da International Headache Society (IHS) e da Sociedade Brasileira de Cefaleia (SBC). O médico apresentou, em setembro, uma pesquisa no Congresso Internacional de Cefaleia que mostra que 70,4% (569 pessoas) de um universo de 808 pacientes brasileiros relataram sofrer com aumento da frequência urinária.

Mais comum nas mulheres: a dor e os sintomas

Dos pacientes com aumento da frequência urinária, 506 eram mulheres e 63 homens. “A enxaqueca, de forma geral, é mais comum em mulheres (3:1 em relação aos homens), o que faz com que sintomas associados — como alterações urinárias — também apareçam mais nas mulheres, mas não necessariamente por causa de diferenças na bexiga em si. Hormônios como o estrogênio influenciam tanto o limiar de dor quanto o funcionamento do sistema nervoso autônomo, o que pode explicar maior sensibilidade e prevalência dos sintomas em mulheres”, completa o médico.

“O aumento da frequência urinária pode servir como sinal preditivo de uma crise de enxaqueca, pródromo (primeira fase da enxaqueca) em muitos pacientes. Isso está cada vez mais relacionado a um sintoma da própria doença. Em paciente com a doença crônica, ele aparece independentemente do paciente estar apresentando uma crise de dor intensa”, explica o Tiago de Paula.

O que o estudo diz sobre a enxaqueca e a frequência urinária?

Mas o que explica essa relação? Segundo o médico, tanto a enxaqueca quanto a bexiga hiperativa estão ligadas a uma disfunção do sistema nervoso autônomo, que regula funções involuntárias do corpo. “É por isso que, durante crises de enxaqueca, alterações na comunicação cerebral podem causar um aumento na sensibilidade das vias nervosas que controlam a bexiga, resultando em urgência urinária ou aumento da frequência.

A disfunção do sistema nervoso autônomo é um mecanismo reconhecido em pacientes com enxaqueca, podendo afetar controle da bexiga, motilidade intestinal, frequência cardíaca, entre outros. A sensibilidade aumentada das vias neurais pode, de fato, levar a sintomas como urgência ou aumento da frequência urinária”, comenta o médico. “Outra explicação envolve a serotonina, um dos principais neurotransmissores envolvidos na fisiopatologia da enxaqueca. Ela também atua no controle da micção, modulando tanto a atividade sensorial da bexiga quanto a atividade do músculo detrusor (que promove o esvaziamento da bexiga). Alterações nos níveis de serotonina podem, portanto, impactar ambos os sistemas”, comenta o especialista.

Avaliação individual é importante

Por fim, o médico diz que é fundamental a avaliação médica especializada para um tratamento correto da enxaqueca. “Geralmente, o tratamento é direcionado à enxaqueca. Hoje, temos opções com a toxina botulínica, realizada no nervo, que ajuda a controlar a enxaqueca ou mesmo os medicamentos monoclonais Anti-CGRPs, que chegaram ao Brasil em 2019 e são os primeiros medicamentos feitos do início ao fim pensando em enxaqueca. Esse tratamento é totalmente seguro e deve ser feito com acompanhamento médico. Ao controlar as crises, os sintomas associados, como o aumento da frequência urinária, tendem a diminuir. Medicamentos específicos para bexiga hiperativa (como antimuscarínicos ou agonistas beta-3) raramente são necessários, exceto se o sintoma for persistente, intenso ou não relacionado diretamente à enxaqueca. A avaliação individual é essencial”, finaliza o médico.