Quem não sofre de disforia de gênero dificilmente vai realmente entender o quanto a cirurgia de afirmação de gênero pode trazer benefícios para a saúde mental das pessoas transgênero. Mas Vanessa Bulcão, psicóloga e mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, explica que as cirurgias de afirmação de gênero, também conhecidas como cirurgias de redesignação sexual, podem sim ter um impacto profundamente positivo na saúde mental das pessoas transgênero a longo prazo.
“A disforia de gênero pode levar a prejuízos no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas da vida. Por isso, estudos mostram que quem passou por essas cirurgias relata um alívio notável dos sintomas de disforia de gênero. Além de melhorias na autoestima e na satisfação com a vida em geral. A sensação de adequação ao gênero com o qual a pessoa se identifica tende a aumentar a satisfação com a própria imagem corporal e reforçar a autoaceitação. Essa congruência entre corpo e mente é essencial para o bem-estar emocional e psicológico, com impacto direto na saúde física da pessoa”, pontua Vanessa.
Mas o que é disforia de gênero?
É uma condição reconhecida pela ciência médica e psicológica que ocorre quando há uma desconexão significativa entre a identidade de gênero de uma pessoa (a forma como ela se identifica) e o sexo que lhe foi designado ao nascer.
Não ter acesso a cirurgia pode causar danos psicológicos
A especialista destaca que a impossibilidade de acessar a cirurgia pode contribuir para o desenvolvimento ou agravamento de transtornos como depressão e ansiedade. “O sentimento de frustração e impotência diante da impossibilidade de realizar uma intervenção desejada gera um estado emocional instável. Dificultando a capacidade de lidar com a situação e aumentando o risco de transtornos mentais. Além disso, essa realidade pode alimentar sentimentos de rejeição e exclusão, uma vez que as barreiras econômicas, sociais e estruturais frequentemente limitam o acesso às cirurgias. Esses sentimentos reforçam a percepção de que as necessidades de pessoas transgênero não são valorizadas ou reconhecidas pela sociedade, intensificando o sofrimento psicológico. Outro ponto que requer atenção é o aumento da ideação suicida. Pois o sofrimento prolongado e a percepção de falta de esperança podem exacerbar sentimentos de desespero.”
Apoio psicológico
O apoio psicológico pré e pós-cirúrgico desempenha um papel essencial na recuperação emocional e mental das pessoas que optam por essas cirurgias, comenta Vanessa. “No período pré-cirúrgico, o suporte psicológico prepara o indivíduo para enfrentar as mudanças físicas e emocionais associadas ao procedimento. Ajudando a gerenciar expectativas e a lidar com possíveis ansiedades e incertezas. Esse acompanhamento promove um entendimento mais profundo das motivações e expectativas. Garantindo que a decisão de prosseguir com a cirurgia seja bem informada e emocionalmente consciente.”
Além disso, a terapia oferece um espaço seguro para discutir e processar reações sociais e mudanças nas relações interpessoais. Que podem ter um impacto significativo na autoestima e no bem-estar geral. “O papel de uma equipe de profissionais de saúde multidisciplinar. Incluindo endocrinologistas, psiquiatras e assistentes sociais, também é importante para fornecer uma abordagem integral à saúde da pessoa transgênero.”
Porém, para isso, o psicólogo deve adotar uma abordagem de validação. Promovendo um ambiente livre de julgamento e focado no fortalecimento da autoconfiança e da autoaceitação. “Abordagens como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) também são eficazes para ajudar a pessoa a identificar e modificar pensamentos disfuncionais. Desenvolvendo estratégias de enfrentamento para lidar com a adaptação. Além disso, é importante destacar que o apoio psicológico não deve se limitar apenas ao período pré e pós-cirúrgico, mas deve ser contínuo, acompanhando o indivíduo em todas as fases de sua jornada. Esse apoio contribui para uma recuperação emocional mais saudável e maximiza os benefícios psicológicos e sociais da cirurgia, promovendo um bem-estar integral e uma melhor qualidade de vida”, finaliza Vanessa.