O perigo do vício em jogos on-line No Brasil, 1 a cada 4 adolescentes têm vício em jogos on-line.

O assunto, que é pouco abordado, chocou as pessoas ao ser mostrado na novela Travessia

De acordo com pesquisa do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP), um a cada quatro adolescentes brasileiros fazem uso excessivo de jogos on-line. “O vício em jogos, mais conhecido como dependência tecnológica, é capaz de causar alterações cerebrais, fazendo com que o indivíduo sinta dependência das substâncias químicas como a dopamina, com recompensas obtidas dentro dos games, interações em redes sociais e até mesmo mensagens de celular”, explica a psicóloga Larissa Fonseca.

Outro fator importante é o psicológico, porque o jogo se torna uma fuga ou serve para “lidar” com estresse e a ansiedade. Além disso, traz a sensação de controle que dificilmente seria repetido na vida real. “Aqui também entra o fator social. As interações on-line causam a sensação de pertencimento e facilidade em conectar-se com outras pessoas”, pontua a especialista.

Vício em jogos on-line é uma doença?

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), sim. Inclusive, ela foi incluída no CID-11 décima primeira revisão da Classificação Internacional de Doença – como um transtorno de saúde mental. De acordo com a psicóloga, o padrão de comportamento encontrado é o mesmo de outros vícios: a perda de controle e dificuldade em deixar de priorizar o jogo acima de quaisquer atividades importantes.

Saúde em risco

O vício em jogos causa danos à saúde em geral, como alerta Larissa. “Além das dores físicas, o jovem pode desenvolver problemas de saúde mental, como depressão, ansiedade, estresse, compulsões e baixa autoestima. Já os problemas de saúde física podem ser obesidade, problemas no sono, problemas oftalmológicos e, em casos mais graves, atrofia dos músculos inferiores”.

Além disso, o jovem que está viciado provavelmente terá seu desempenho escolar diminuído. E poderá perder suas habilidades sociais com a família, amigos e até novos possíveis colegas reais. A especialista esclarece que pode existir, inclusive, dificuldade para desenvolver empatia, já que o contato pelas telas não permite que o jovem se coloque no lugar do outro.

Outro fator importante que o adolescente pode ter que enfrentar é a dificuldade para lidar com desafios, limites impostos, controle da agressividade e impulsividade. “Vale a pena frisar que a maturação do córtex pré frontal normalmente ocorre entre 25 a 30 anos, que é o responsável pelo controle dos
impulsos, solução de problemas, manter a atenção e tomar decisões”, complementa.

Os sinais dos jogos on-line são psicológicos e físicos

Larissa explica quais sinais o adolescente pode apresentar quando está viciado em jogos e aparelhos eletrônicos:

  • Passar muitas horas jogando, a ponto de interferir em outras atividades (obrigações, brincadeiras, interações sociais reais e sono);
  • Perda de interesse em outras atividades que antes eram prazerosas;
  • Dores nos braços e mãos; dores de cabeça; nas costas, nuca e nos olhos. “Muitas vezes, o adolescente não muda de posição ou fica muito tempo em um movimento repetitivo, o que causa problemas ortopédicos”, salienta;
  • Sente-se irritado, ansioso ou triste quando não está jogando;
  • Mente sobre a quantidade de tempo que passa jogando e, quando confrontado, pode entrar em grandes conflitos.

O tempo é importante

Para a psicóloga, o controle do tempo de tela é algo importante. E os pais devem se certificar de que não há nenhum comprometimento em todas as áreas da vida do adolescente. O Manual de Saúde da Sociedade Brasileira de Pediatria indica o tempo de tela recomendado para cada idade.

  • Menores de 2 anos: evitar a exposição a qualquer tipo de tela, mesmo que passivamente;
  • Entre 2 e 5 anos: no máximo uma hora por dia, com supervisão e acompanhamento de um adulto responsável;
  • Entre 6 e 10 anos: no máximo duas horas de tela por dia com jogos interativos e TV de qualidade.
  • Entre 11 e 18 anos: não ultrapassar 3 horas por dia, com foco em atividades como trabalhos escolares, jogos interativos e programas de TV com qualidade.

Repercurssão em horário nobre do vício em jogos on-line

Na novela Travessia, os telespectadores acompanharam o drama de Theo (Ricardo Silva), que enfrentava a dependência digital e já sofreu crises de abstinência, ansiedade e comportamento agressivo. Duda Santos, que interpretou Isa, irmã do jovem na trama, passou pela mesma situação na vida real também com seu irmão, Juan Santos.

Em conversa exclusiva com a Malu, a atriz explicou que fazer a novela mostrou o outro lado dessa moeda que ela não conhecia, permitindo que tivesse acesso a informações para entender o que acontecia dentro de casa. “Na vida real, eu não tinha informação, não lidava da forma que tinha que ser. É um vício como qualquer outro. E a Isa se informa e tem um entendimento da situação que eu não tinha
na época”, admite.

A família da atriz enxergava as atitudes de seu irmão como uma fase ou desobediência. “Minha mãe brigava e colocava de castigo achando que ia resolver, mas era muito mais sério que isso”, relembra Duda. Quando recebeu o roteiro, Duda se assustou com a história, mas ficou feliz em poder levar essa informação para dentro da casa das pessoas. “Muitas famílias ficam desamparadas ou não entendem o que está acontecendo, como a minha. É muito importante ter alguém contando essa história e dando um norte para muitas famílias. Espero que nossa história esteja informando muitas famílias. O vício em jogos é urgente, questão de saúde pública e precisamos ter atenção. Não desistam de quem vocês amam!”, pontua a atriz.

Lidando com o problema

Ao perceber que o adolescente está sofrendo de vício em jogos on-line, o primeiro passo é procurar auxílio médico, para tratamento através da terapia cognitivo comportamental, que auxilia a pessoa identificar e modificar padrões de comportamento e pensamentos negativos que provavelmente contribuem para o vício. “É importante, em terapia, perceber os gatilhos e desenvolver metas realistas para, aos poucos, reduzir o tempo gasto nos jogos”, finaliza a psicóloga.