
Saiba mais sobre essa prática espiritual milenar!
A leitura dos búzios é uma das artes adivinhatórias mais famosas e belas que existem, mas muitas pessoas não compreendem bem como funcionam. Por essas e outras dúvidas, a MALU conversou com Luyza Ofadeomin Èsù Mu Iparada, sacerdotisa do Terreiro Aldeia dos Malungos em Mauá (SP), e Nina D´Oyá Igbalé, consultora esotérica da iQuilibrio. Confira!
Como e onde surgiu a prática de leitura de búzios?
Luyza: “A prática de leitura de búzios, conhecida como Merindilogun, tem suas origens nas tradições iorubás. A diáspora africana trouxe essa prática ao Brasil, e diversas religiões de matriz africana a mantêm viva até hoje. O Merindilogun é um sistema oracular que revela os caminhos do destino através dos Odù. Cada família ou tradição pode ter formas específicas de interpretar o oráculo e até divindades diferentes que respondem. Há uma a rica diversidade cultural presente em cada linhagem.”
Nina: “Na prática, os sacerdotes lançam e interpretam os búzios — conchas, geralmente do molusco Strombus gigas — conforme suas posições. Religiões afro-brasileiras, como o Candomblé, frequentemente associam essa prática à comunicação com os orixás e ancestrais.”
Como funciona uma consulta de búzios e o que ela pode revelar sobre a vida de uma pessoa?
Nina: “As revelações podem abordar áreas como relacionamentos, caminhos profissionais, saúde emocional e espiritualidade, ajudando o consulente a compreender melhor sua situação e tomar decisões mais informadas.”
Luyza: “A consulta de búzios revela os caminhos dos Odù, que podem trazer tanto aspectos positivos (iré) quanto negativos (ìbí). Cada Odù carrega múltiplas camadas de conhecimento, incluindo Orixás que falam através dele, além de cristais, flores, folhas, pontos da natureza, situações corriqueiras, doenças, medicinas e magias associadas a esse caminho específico. Os Odù narram a história dos nossos ancestrais e ensinam através desses relatos como lidar com as situações que encontramos. Assim como nós, os Orixás também consultavam o oráculo, se orientavam pelos Odù, faziam ebó e seguiam as orientações recebidas, ou não, traçando suas consequências a partir dessas escolhas.”
O que devemos levar em conta antes de procurar uma consulta de búzios?
Luyza: “É essencial estar aberto a receber as orientações das divindades. O jogo sempre proporcionará direcionamento, e muitas vezes isso envolve a realização de um sacrifício (ebó). Ele pode se manifestar tanto na forma de rituais quanto na necessidade de ajustes profundos, como a manutenção do nosso caráter e conduta. A consulta requer respeito e disposição para seguir os conselhos, que podem incluir mudanças internas significativas. Uma forma de compreender isso é comparar com o processo de procurar um médico: quando você apresenta um sintoma, consulta um médico, realiza exames, recebe um diagnóstico e é orientado a seguir um tratamento adequado, caso você opte por não fazer o tratamento, estará sendo negligente consigo mesmo e com todas as pessoas que se mobilizaram para te apoiar, o que pode gerar consequências sérias. E não deve-se pensar que são os Orixás lhe punindo, mas sim as suas próprias escolhas.”
Como os praticantes iniciam aqueles que se interessam pela prática?
Luyza: “Aqueles que se interessam pela iniciação devem passar por uma consulta para confirmar se têm caminhos para isso e se esses caminhos preveem o sacerdócio. Após a iniciação, os sacerdotes orientam essa pessoa durante um período de preparação que pode durar alguns anos, enquanto ela pratica o jogo para si mesma. O mais importante é que tenha vivência dentro do terreiro, para que receba de seus mais velhos o direito de exercer suas consultas.”
Como o sacerdote realiza o jogo de búzios e quais elementos ele utiliza para garantir uma leitura precisa?
Luyza: “Na minha tradição, o praticante só realiza corretamente o jogo de búzios após ser iniciado no culto e estabelecer os assentamentos de Èsù e Osun, que devem ser devidamente cultuados. Para oferecer uma consulta precisa, ele solicita dados como o nome completo, a data de nascimento e, em alguns casos, o nome da mãe. Em consultas à distância, pode-se até solicitar o endereço para garantir mais exatidão na leitura. O jogo conta com 16 conchas. A forma como os búzios caem revela o Odù presente no momento, e o sacerdote ou sacerdotisa analisa se esse Odù está trazendo iré (boa sorte) ou ìbí (má sorte). A partir disso, o sacerdote oferece orientações sobre os rituais e as ações que o consulente deve seguir para manter o equilíbrio ou apaziguar alguma força negativa que possa estar afetando seus caminhos.”
Quais são os aspectos mais difíceis na interpretação dos búzios?
Luyza: “A interpretação dos Odù exige muito conhecimento, pois cada Odù carrega múltiplos significados que precisam ser contextualizados no momento da consulta. Os Odù são narrativas ancestrais que se repetem ao longo do tempo, refletindo a natureza cíclica da vida. A subjetividade do consulente é respeitada. Mas, é importante entender que os Odù não mudam de acordo com o desejo de quem consulta. Eles adaptam as mensagens à realidade, baseando-se em histórias e ensinamentos milenares. A sabedoria ancestral é transmitida através dessas narrativas e precisa ser interpretada com responsabilidade e fidelidade.”
Qual a diferença entre os búzios e outras práticas, como o tarô?
Luyza: “Além das origens distintas, o tarô e o Merindilogun têm enfoques diferentes. O tarô utiliza símbolos e arquétipos de uma tradição europeia, sendo uma excelente ferramenta de orientação. Já o Merindilogun está diretamente ligado ao destino e às possíveis mudanças que podemos fazer através da sabedoria ancestral, incluindo orientações sobre rituais e ebós. Ambos têm seu valor e aplicabilidade, mas o jogo de búzios oferece uma conexão mais direta com a ancestralidade e com as forças que regem nosso destino. Enquanto o tarô pode sugerir a presença de energias espirituais, o Merindilogun permite identificar seu Orixá e traçar as ações necessárias para equilibrar ou melhorar as situações apresentadas. É importante ressaltar que não é possível conhecer Orixás e ritualísticas através do tarô. Cada cultura molda a fala de seu oráculo, e modificar isso pode configurar apropriação cultural.”